quinta-feira, 9 de julho de 2009

PERTO DO FIM - 21/12/2012


O tumulto das ultimas três semanas parecia enfim substituir-se pela consternação. As pessoas finalmente pareciam aceitar o inacreditável e de certa forma começavam a resgatar uma aparente serenidade diante da tragédia que se avizinhava.

Talvez, se houvesse alguma forma de reverter todo aquele processo, a sociedade estivesse mais ativa, no entanto aceitavam o que era mesmo inevitável.

Nas ruas havia apenas destruição gerada pelo pânico justificado das pessoas. Muitos tinham perecido nessa batalha de todos contra todos, todos contra ninguém e o mais inerente a natureza humana, cada um por si. Acabaram matando uns aos outros como se isso pudesse garantir-lhes alguma sobrevida.

Nem a mais devastadora tragédia natural seria capaz de tanto estrago. O ser humano era mesmo um animal vil e imprevisível.

Os que ainda restavam e haviam sobrevivido ao desespero, esperavam quase que sôfregos a chegada da escuridão final.

Há poucos dias do Natal, Pedro completava seus 23 anos, e sabia que não teria outro aniversário para celebrar. Entre estranhos alimentava-se numa espécie de sopão comunitário. Não entendia porque aquelas poucas pessoas que organizavam a distribuição, ainda se importavam com o “comunitário” com o “voluntário”, mas se não fosse isso, certamente estaria passando muita fome.

Ele não cria na religião dos homens. O fim do mundo, o apocalipse ou o armagedon para ele eram apenas obras de ficção popular. Mesmo agora, diante do quase tangível fim, ele ainda permanecia reticente. Não olhou nenhuma vez aos céus em suplicas.

Viu uma multidão ensandecida destruir toda a cidade. Viu a multidão se destruindo também. Viu essa mesma multidão destruir sua família e todos a quem amava. Com tudo isso sua descrença em Deus aumentou, só não pode guardar qualquer mágoa ou ressentimento, afinal, o Pai infalível de fato não existia. O fim dos tempos havia sido fruto do homem.

A televisão ligada fez com que todos se calassem. Algumas raras transmissões ainda eram veiculadas. Em todo país a situação era idêntica. Muitos mortos em função do pânico e do caos, os sobreviventes aguardando a chegada do fim.

Pedro mal podia acreditar que aquele calendário quase místico do povo Maia realmente trazia uma mensagem para o século XXI. Agora as noticias rendiam-se ao lógico. Em menos de duas semanas seria o afamado 21/12/2012, e o mundo não sobreviveria a esse dia, DOOMSDAY.

Tudo havia começado num país da Europa, mas a experiência era anuída por todo os paises poderosos. Não previam, mas algum erro de calculo dos cientistas e engenheiros, ou mesmo o destino da humanidade, acabou gerando o que agora chamavam de ‘escuridão final’.

Sabia-se do poder em potencial da antimatéria, só não sabiam das proporções que o mau uso dela poderia gerar. Simples atomos se aniquilando, o que deveria ser controlado acabou fugindo totalmente do domínio dos cientistas e a tragédia aumentou exponencialmente.

Toda tentativa de contenção foi inútil, primária. Quanto mais tentavam isolar a aniquilação das coisas, maior o evento se tornava. Como num buraco negro de força gravitacional incontrolável o experimento consumiu-se, depois o laboratório acabou dragado para o nada e assim sucessivamente com tudo que se acercava.

Mantiveram o episódio incomum sob o mais absoluto sigilo. Quando a noticia inevitávelmente vazou, já via-se um fenômeno incontrolável. Naquele mesmo dia a cidade inteira já estava completamente aniquilada.

Também ninguém podia explicar, categoricamente, o que estava acontecendo, ou o que sobrava de tudo depois da colisão entre a matéria e a antimatéria. Nesses dias falou-se muito da misteriosa e quase desconhecida matéria negra, mas não haveria tempo hábil para descobrirem de fato o que estava acontecendo ou como reverter aquele quadro progressivo de destruição.

Estavam a sete dias e meio sem qualquer transmissão ou comunicação com outros continentes, provavelmente eles já haviam sido tragados pelo evento.

Grandes potencias do globo sucumbiram como as pequenas. Armas de guerra, escudos, mísseis, tecnologia bélica de altíssima complexidade, foram inúteis. A corrida de quem tinha dinheiro foi para os pólos do globo, onde, teoricamente, seriam os últimos lugares a desaparecerem, provavelmente em 21/12.

Pelos cálculos dos cientistas remanescentes o evento chegaria ao país ainda naquela semana, e nada poderia detê-lo. Começava uma infausta contagem regressiva.

Houve novos choros e abraços emocionados, poucos ataques histéricos, as pessoas mais exaltadas já haviam se consumido durante as três semanas anteriores de espera.

Após a refeição Pedro se afastou daqueles desconhecidos que se tratavam como uma nova família. Preferia a solidão e a companhia dos seus pensamentos desordenados. Era um aniversário que nem seu pior pesadelo poderia tê-lo levado.

A cidade já não tinha um serviço de eletricidade regular, logo que o sol se punha a escuridão tomava conta de tudo.

A noite chegou e junto com ela o cheiro da morte. Não saber se veria novamente a luz do dia era uma das piores sensações que sentiu na vida. Já concebia, mesmo que com dificuldade, morrer durante o dia, vendo que se passava, mas a morte durante a noite o enchia de pavor. Ouvia falar em aniquilação de matéria, mas não podia imaginar como isso acontecia na prática, ou se seria uma morte dolorosa.

Pedro caminhava numa parte deserta da cidade, procurava um lugar para dormir quando quase foi atropelado por um carro que passou em alta velocidade. Antes que conseguisse praguejar qualquer coisa, o carro freiou e em marcha ré acelerada voltou até o jovem.

- Estamos indo para o sul! – o faról da van quase cegou Pedro que já se acostumava a escuridão. – Vem com gente! Dizem que quem sobreviver ao dia 21 escapara dessa escuridão final! Vem com a gente, não temos nada mesmo a perder! – Pedro não reconheceu a voz daquele homem, mas sentiu que finalmente alguém trazia-lhe um presente de aniversário: a esperança.


Um comentário:

Giane disse...

Pode-se perder tudo. Até a Fé no "invisível", mas só se morre mesmo, quando se perde a Esperança.

Beijos mil, João!!!

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